terça-feira, 5 de janeiro de 2016

PALAVRÃO (Poema de Isabel Furini)

Puta pariu! Gritei – e minha amiga chorou.
Eu tinha seis anos
e não sabia o que significava.

Meu pai chegou com o cinto da (in)justiça.
Por que ofendeu a mãe de sua amiga?
E bateu o chicote contra a parede.

Ofender uma mãe sem dizer a palavra mãe?
Pensei eu - estranha magia.

Eu nasci numa época mágica:
as crianças não germinavam no ventre materno,
as crianças chegavam voando - as cegonhas traziam os bebês.

Época ruim! Os irmãozinhos vinham voando e as palavras
se aprendiam a chicotadas.

Esse dia descobri um mundo paralelo: o mundo das palavras.
Desde então minha vida é um discurso sem silêncio.
Em sonhos meu pai ainda fustiga contra a parede
o cinto (des)educativo
e eu fico muda de terror.

Estudei e ensinei oratória - nas aulas sonhava salvar inocentes
do chicote de algum ignorante poderoso,
desses que gostam de abater os outros - impiedosamente.

Palavras nunca são inocentes, são arpões
que derrubam crianças.

Palavras, peças de artilharia letal para dilacerar vidas.

Palavras, barcos que navegam 
no oceano dos sentimentos.

Palavras, perigosas armas,
embriões de futuros acontecimentos.

Ah! A tirania das palavras...

Isabel Furini é escritora e poeta.
Fotografia e edição de Isabel Furini

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