sexta-feira, 7 de novembro de 2008

A FOFOQUEIRA

A FOFOQUEIRA Durante três dias Raquel, a fofoqueira do bairro, observou a vizinha Valéria que morava na casa antiga, na frente da sua. Rua sem saída. Os vizinhos comentavam que Valéria havia enlouquecido. Fazia três anos que perdera o marido e um ano da morte da mãe. Valéria passou muito tempo de luto e tristeza. Dois meses atrás se havia aventurado numa viagem turística ao Nordeste, junto com uma prima. Voltou de bom humor, mas nos últimos dias falava sozinha, gesticulava, ria... Teria alguma visita? Essa tarde de sábado Valéria ria muito. – Ela enlouqueceu!.. – gritou Raquel. – Venha, querido, venha e olhe... O marido relutou um pouco, mas como a esposa continuava: Venha, venha. Ele deixou o jornal e levantou–se trabalhosamente da poltrona onde estava esparramado. Aproximou–se da janela. Olhe lá, olhe João parece que está falando com alguém.. mas Valéria está sozinha desde que a mãe morreu. Falarei com ela. Talvez precise de um médico, de um psiquiatra ou de terapia, sei lá... Raquel pegou o telefone: – Olá,Valeria? Você está bem? – Feliz com meu noivo nordestino – respondeu rindo Valeria. Raquel, curiosa, continuou a espiar pela janela. Querido, venha, venha ver. Venha por favor... O marido novamente deixa o jornal de lado e se aproxima a passos vagarosos até a janela. – Olhe – disse a mulher – Valeria fala e ri sozinha!.. – Sozinha, não! Com seu noivo imaginário, ironiza o marido. Volta a sentar–se na poltrona e pega o jornal. – Eu vou falar com ela – enfatiza Raquel. Minutos depois Raquel aperta com força a campainha. Abre-se a porta. – Este é Armando, meu noivo – grita Valeria desde a cozinha. Só nesse momento Raquel repara no anão de pijama azul, na ponta dos pés, segurando–se na maçaneta da porta. Sorridente, o anão a convida a entrar. Raquel fica paralisada ao lado da porta. Armando insiste: – Sente-se vizinha, pode pegar um pedaço de bolo. Eu mesmo fiz. – Aqui está o chá mate – disse contente Valéria. Coloca a chaleira na mesa, agacha-se e abraça o anão. Ele, sempre sorridente, dá um beijão na boca da namorada. Depois sobe na escadinha que está ao lado da mesa e serve um pedaço de bolo para dona Raquel. Raquel sem palavras senta–se na cadeira e pega o pratinho com o bolo. Acanhada, não sabe o que dizer. Os três ficam em silêncio. Raquel, tentando ser agradável pergunta: – É bolo de laranja? No dia seguinte, Raquel falava com Adelaide, a velhinha do sobradinho amarelo, quando vê passar Valéria, de mãos dadas com Armando. Os dois, sorridentes, cumprimentam e continuam seu passeio. Sem poder conter-se, Raquel murmura para Adelaide: Como ela pode sair com um homem tão pequeno? A velhinha, muito jocosa, emenda: segundo ouvi dizer, Armando é pequeno só de estatura dona Raquel, só de estatura.

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